16 de Abril, 2013

O que significa servir um amalá para Xangô?

Por Pai Ronie de Ogum Adioko

Pai Ronie de Ogum

Xangô, que nos rituais  gege-nagô é o orixá da justiça, do equilíbrio, aquele que decide o certo e o errado, sendo representado principalmente pelo seu raio e o oxé (espécie de machado que corta dos dois lados, como a justiça deve ser, neutra e imparcial).

Possui como principal comida ritual o Amalá, por isso chamada de comida de axé, que deve ser colocado em gamela, quando possível, preparado por um filho de Xangô. Servir o Amalá é sempre um momento de muita emoção, e deve ser de união também, é quando temos a oportunidade de poder compartilhar do axé deste Orixá, com todos os presentes, é se encher de alegrias e forças a cada novo dia, é ter a certeza que Xangô está presente em todos os nossos momentos, nos acompanhando em cada decisão, em cada novo passo em nossa vida diária.

Quando for servido em um Xirê, o preparo do Amalá deve iniciar no dia anterior, com a maceração da mostarda (macerada para reduzir o amargo, característico da folha), para no dia seguinte um filho de Xangô (se houver) fazer o preparo do pirão (preparado a partir de farinha de mandioca crua) e do molho para ser servido. O molho, com a mostarda (folha) é servido sobre o pirão.

Nos rituais gêge-nagô a culinária é de extrema importância, pois o Orixá já está do lado de quem prepara, observando o carinho dispensado, a atenção dada e a dedicação do preparo inicial até a entrega do axé. Não basta fazer, é preciso fazer certo, sem esperar receber nada em troca por isso. É o que chamamos de amor, pelo Orixá, pela religião.

Mais do que servir uma linda oferenda, o “seu coração, deve estar puro”, lembrando que o Orixá sabe quando estamos fazendo com o coração, pois não adianta fazer como alguns filhos e Pais de Santo (que nem poderiam ser chamados de Pai) que pedem e abençoam seus filhos pela boca (na frente de outros, para mostrar uma máscara, aquilo que não são) , e pelas costas cortam muitas aves e fazem feitiços para prender seus filhos. A hipocrisia e o desrespeito com os Orixás é o maior problema do batuque. A doença e os problemas futuros que estes recebem é a certeza que o Orixá tudo enxerga e tudo sentencia, nos mostra que Xangô é imparcial, retirando destas casas todos seus filhos que foram vítimas das artimanhas de alguns.

Segundo DaMata (2001), existe diferença entre alimento e comida, e esta última é capaz de identificar quem a come, conforme citação apud de Maciel (2005)

“Dize-me o que comes e te direi qual deus adoras, sob qual latitude vives, de qual cultura nasceste e em qual grupo social te incluis. A leitura da cozinha é uma fabulosa viagem na consciência que as sociedades têm delas mesmas, na visão que elas têm de sua identidade”.
(MACIEL, 2005, p. 50).

O Amalá, identifica Xangô na comunidade onde ele está inserido, fortifica o seu axé, identifica seus membros, e cumpre um compromisso social, pois em um Xirê é aberto a toda a comunidade.

Poder participar é ter a possibilidade de alimentar a sua fé a cada dia. Assim como é fornecido alimento ao corpo, a fé, é o alimento oferecido ao sagrado. Compartilhar o alimento com o sagrado é ter a possibilidade, e ser servido do mesmo alimento que é ofertado ao Orixá, neste caso Xangô.

Quando é degustado pela comunidade e filhos de santo, estamos não somente ingerindo um alimento, mas também resgatando uma ancestralidade, estamos desenvolvendo nossa humildade, já que na sociedade atual não comemos com as mãos, comemos o amalá com as mãos em respeito a Xangô, em respeito aos Orixás e a religião africana.

É crucial que para participar deste ritual os participantes estejam puros, pois sendo Xangô o Orixá da balança, do equilíbrio ele busca a justiça onde ela estiver, inclusive quando seus filhos erram, pois a justiça é feita onde estiver.

Em todo o lugar onde estiver um Babalorixá, uma Yalorixá ou mesmo uma pessoa não iniciada, com certeza, estará também cultuando e resgatando a ancestralidade africana.

É imprescindível que o preparo do Amalá seja realizado com dedicação e pureza no coração, é necessário estar em sintonia com seu Orixá, e esta sintonia somente é alcançada com carinho de quem está preparando o Amalá.

O ritual do Amalá é a oportunidade que todos tem de compartilhar momentos de muita fé e agradecer a Xangô, além de fazer seus pedidos e fortalecer o axé.

Pois o axé é fortalecido com ações corretas a cada dia, axé é uma força, que segundo Santos (2008) “como toda força, pode diminuir ou aumentar. Essas variações estão determinadas pela atividade e condutas rituais”.

Daí a importância de uma conduta correta e adequada a religião africana. Não basta ser de religião é preciso viver a religião, e a religião é vivida através de ações diárias com os orixás, quando se prejudica um filho do axé, estamos prejudicando seu Orixá.

O Amalá para Xangô é o momento onde todos se reunem para desenvolver ainda mais a sua fé, desenvolver o axé e resgatar a ancestralidade de cada um.

Orixá é alegria, é paz e tranquilidade especialmente Xangô, orixá da justiça e do equilíbrio, capaz de tomar decisões certas onde nós não teríamos condições.

Neste sentido o Amalá para Xangô é o momento onde Xangô recebe todos os seus filhos, e os mostra o caminho certo, pois como Pai, ele educa, corrige e faz com que seus filhos andem e se desenvolvam a cada dia mais em toda a sua plenitude.

Que neste novo ano todo Amalá para Xangô servido no Ilé Orixá Ogum Adioko e Oyá Tofã seja para trazer prosperidade, alegria e justiça a todos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

DAMATA, Roberto. “Sobre comidas e mulheres”. In: DAMATA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro.ROCCO, 2001. Apud MACIEL, Maria Eunice. 2005. “Os tipos característicos. Região e estereotipos regionais”. Humanas, Porto Alegre, vol. 18, n. 1/2, jan./dez. p. 171-91. p. 171-91

SANTOS, Juana Elbein dos. Os Nàgô e a morte: Pàde, Àsèsè e o culto Égun na Bahia; traduzido pela Universidade Federal da Bahia. 13 ed. Petrópolis, Vozes, 2008.